Graça e Formosura

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Neste fim-de-semana que passou falei para um grupo de senhoras sobre a aparência feminina, com foco especial em mulheres cristãs cujos maridos estão se preparando para assumir posições de destaque nas igrejas. Construí a palestra a partir de dois artigos, que eu escrevi e que estão postados neste blog (aqui). Hoje quero colocar apenas uns pensamentos complementares ao assunto, sem lidar com os argumentos básicos contra e a favor do adorno feminino…

Para me inteirar do assunto novamente, fui examinando os livros que tenho para mulheres e sobre mulheres, colecionados durante os últimos 35 anos. São uns 50, sem contar aqueles que lidam especificamente com esposas ou mães.

Alguns dos livros são bem recentes. Outros são antigos. Enquanto lia, percebia as diferenças que existem entre algumas opiniões do passado e as de hoje. A leitura me levou de volta ao tempo quando eu era moça, no Canadá, e a maioria das mulheres da minha igreja não usava maquiagem. Eu levava aquilo muito a sério. Cheguei a escrever um estudo sobre o assunto para o grupo de jovens da igreja, defendendo a não utilização. Entretanto, era permitido jóias e bijuterias, roupas atraentes, manga curta, cortar cabelo, fazer permanente… Usávamos chapéus para ir à igreja. E a maioria desses não eram discretos—era um verdadeiro desfile de penas, flores, frutas e objetos tridimensionais e multicoloridos. Mas maquiagem, não podia, de jeito nenhum.

Eu gostava muito de ler, e lembro-me de uma série de romances cristãos muito apreciados na época, nos quais as heroínas mostravam a sua pureza, inocência e fé pela beleza do seu rosto limpo. É claro que elas sempre possuíam uma beleza natural estonteante. A autora daqueles livros passava páginas descrevendo estas jovens—o formato do seu rosto e olhos, o perfeito narizinho, a pele aveludada, as bochechas que ficavam saudavelmente coloridas sem nem um pouco de blush, as covinhas que surgiam quando elas sorriam, os dentes perfeitos e perolados, as sobrancelhas arqueadas, os cílios enormes e espessos, tudo emoldurado por cabelos sedosos e lustrosos… Acompanhavam essas características faciais um corpo delgado, uma cintura fina, um porte aristocrático, um andar gracioso, dedos longos e finos em mãos delicadas. E a gente lia aqueles livros e suspirava com os detalhes da fidelidade de Deus para com aquelas moças que não se pintavam.

Sem nem querer, elas conseguiam conquistar o coração dos homens mais ricos e charmosos das suas cidades… Estes estavam sempre entediados com as moças vazias e despudoradas que lhes rodeavam—cuja maquiagem, em cima de olhos duros e bocas desdenhosas e desaforadamente vermelhas, era descrita tintim por tintim. A pintura do rosto e dos cabelos caracterizava subterfúgio, engano, falsidade e hipocrisia.

Então aparece a heroína—ele nota a sua beleza natural e depois observa que esta é um reflexo do seu coração puro. Ela descobre que ele, apesar de ser rico, está solitário e triste—que a casca dura que ele apresenta é apenas uma proteção para não ser ferido, que lá dentro ele é um homem bom que só precisa aprender a amar e a ser amado. E aí ela procura ganhá-lo para Cristo e, ao mesmo tempo, acaba sendo amada. E os dois vivem felizes para sempre… Com muito dinheiro e nenhuma maquiagem.

No começo, eu adorava ler aquilo. Depois comecei a achar muito repetido. A autora escrevia bem, e as situações sempre eram diferentes, mas ela não abria mão deste detalhe. Uma moça boa não usava batom, rimel, blush, esmalte… Era só confiar em Deus que o príncipe encantado iria aparecer… Só tinha um problema. No caso delas sempre havia a combinação das duas belezas—a interna e a externa—que havia ganho o coração daqueles homens lindos, esbeltos e altos. Entretanto, na vida real, a maioria das pessoas não tem nem a cara nem o corpo destas belas e boas mocinhas. Por mais que se esforcem para refletir a beleza de Cristo através do seu jeito de ser e agir, o fato de ser crente não garante a estética harmoniosa e atraente que era o patrimônio das jovens desses livros, nem silhueta de manequim.

Assim, como exemplo de vida, as histórias não eram realistas. Nem pretendiam ser. Mas acabavam sendo cruéis para aquelas que não apenas não eram bonitas, mas que se viam proibidas de reforçar e realçar as partes belas do seu rosto ou corpo (discreta e modestamente) ou de amenizar ou esconder os aspectos menos harmoniosos.

Ainda assim, de certo modo—minha história acabou sendo parecida às daqueles livros. Conquistei, sem planejar isto e sem um pingo de maquiagem, o coração de um homem bonito, esbelto e alto (porém, não rico), em meio a situações que, realmente, eram inusitadas e fascinantes—material para um livro bem interessante…

Nem por isso, só porque Deus foi misericordioso comigo e pareceu honrar a minha fidelidade ao entendimento das Escrituras que defendia naquela época, eu devo usar o meu exemplo para defender esta tese. Apesar de muito alta, eu tinha formosura e um rosto bonito. Entretanto, 35 anos depois, a história já é outra. Creio, também, que os tempos são outros. As coisas não são mais como eram nos dias em que eu era moça. Antigamente, havia muito menos programas sugestivos na televisão, não havia Internet, as propagandas da TV e das revistas eram decentes, as roupas eram menos sensuais, o comportamento das pessoas era muito menos ligado ao sexo… Levava anos para a moda mudar… Também não havia tanto merchandising.

Simplesmente, havia muito menos ênfase na aparência (apesar de sempre ser importante). Não havia aquele fascínio com a beleza do corpo e a imagem jovem que existe hoje em dia. As mulheres cristãs assinavam revistas que lidavam com detalhes das suas responsabilidades e relacionamentos, com apenas alguns artigos e propagandas ligadas à estética inseridos no meio. Elas queriam ser bonitas, mas aquilo não era o essencial das suas vidas. Conseguiam se realizar de muitas maneiras sem alcançarem a “perfeição” exterior. Os homens crentes procuravam publicações técnicas ou ligadas a esportes. Não eram tão bombardeados com o conceito que a felicidade e significado individual eram ligados ao sexo e que este dependia da aparência.

Creio que temos que partir do princípio que existimos para agradar a Deus e para ser bênção aos seres humanos que nos cercam (Jesus faz este resumo da vontade de Deus para nós no fim de Mateus 22). O nosso relacionamento com a nossa aparência vai ser equilibrado quando percebermos e resolvermos que ela é instrumento para estes dois fins e não alvo em si. Afinal, já temos valor intrínseco e eterno. Somos filhas do Rei do mundo. Temos que cultivar o nosso relacionamento com nosso Pai celestial, conversando com Ele diariamente em oração. Precisamos recorrer sempre ao estudo do livro em que Ele revela quem Ele é e como Ele quer que vivamos. Temos que reconhecer, na presença dele, que tem certos aspectos da nossa vida que não podem ser modificados por nós e pedir forças e sabedoria para continuar assim mesmo. Minhas irmãs, se não estivermos fazendo isto em primeiro lugar—cultivando o relacionamento com o Criador e Salvador com quem planejamos morar daqui a poucos anos—garanto que o restante dos nossos esforços serão frustrantes e inúteis. Aí que entra o que realmente é vaidade, nos seus dois sentidos.

Primeiro tem que vir o “temor ao Senhor” e depois as outras coisas irão se encaixar—princípio ilustrado tão bem por Jesus quando ele fala das nossas preocupações em Mateus 6 e conclui que todas as coisas (até além das básicas—afinal ele está falando da beleza e não da utilidade das roupas de Salomão e dos lírios) serão acrescentadas para quem se dedica ao “reino de Deus” (e não a si mesmo) em primeiro lugar (33).

Quero inserir aqui um pequeno pensamento sobre a “mulher virtuosa” de Provérbios 31 porque o capítulo conclui com a seguinte declaração (30): Enganosa é a graça e vã a formosura, mas a mulher que teme ao Senhor, essa será louvada. É um versículo que eu, no passado, ouvia frequentemente como argumento para não me preocupar com a minha aparência. Mas prestemos atenção a tudo que vem antes, para ver se este versículo não é outro daqueles que devem ser entendidos como a maneira hebraica de expressar—fazendo um contraste para dizer que entre duas coisas boas, uma é melhor. Portanto, é bom ter graça e ser formosa, mas temer ao Senhor em tudo que fazemos e falamos, é muito mais importante. (Quem quiser entender o princípio hermenêutico (de interpretação) usado nesta passagem e para os outros versículos que parecem proibir o adorno da mulher, poderá ler os artigos postados anteriormente (ver o link no início da postagem).

Afinal, este versículo de Provérbios 31 é precedido por vários outros que descrevem a “mulher virtuosa” cuidadosa e diligentemente vestindo a si e a sua família com as roupas mais chiques da época. Ela é comparada com as mais finas jóias! Zelar pela beleza externa, para ela, era algo legitimo! Tem horas em que olhamos aquela senhora “perfeita” e desanimamos. Mas ultimamente ela tem me estimulado. Sei que nunca poderei ser tudo que ela é. Mas ela me mostra que uma mulher determinada e perseverante (que se vê instrumento do Senhor que respeita e ama) pode muito. Não precisamos ser passivas, vítimas de um destino de pobreza e limitações. Com esforço, podemos fazer bem a nossas famílias, e à nossa comunidade, de maneiras fascinantes e criativas. Podemos, também, na medida certa, nos esforçar para obter conforto, beleza e elegância para todos na nossa família, enquanto equilibramos o orçamento e encontramos maneiras para incrementá-lo.

Hoje acredito que nós, mulheres, precisamos prestar atenção à nossa aparência. Portanto, por um lado, temos que fugir do exagero (foi isto que Paulo e Pedro queriam). É possível ficar tão preocupada com o nosso visual que acabamos gastando dinheiro demais, tempo demais, deixando de lado pessoas e deveres enquanto focamos apenas em nós mesmos—o narcisismo. Precisamos ter equilíbrio. O alcance do nosso ministério é ligado à nossa atitude. Queremos que a nossa mensagem ao mundo não seja diminuída ou substituída pela parte que podemos controlar da nossa aparência.

(De fato, podemos impactar o mundo com a nossa atitude em cima do leito da doença ou da morte—inteiramente sem maquiagem, tratamentos e adornos. Ou em meio a uma crise em que não temos condições para trabalhar estes aspectos. O que está no nosso coração é bem mais importante e se não trabalharmos isto nos “dias bons”, não vai ter nada bonito aí para ser revelado nos “dias ruins”. Teremos perdido a beleza mais importante, correndo atrás daquela que não é duradoura).

Aquela lipo ou bronzeado; ou tratamento caríssimo de pele ou de cabelo, pode não ser o melhor para o relacionamento ou para a família. O fato de não termos dinheiro disponível é um bom sinal para pensar uma, duas, três vezes antes de insistir no tratamento ou procedimento ou produto. O nosso marido não deve nunca ter que encarar que nós estamos endividados porque a mulher dele está gastando a metade do salário só com os detalhes da sua imagem externa.

Por outro lado, por uma razão ou outra, podemos nos preocupar de menos com a nossa aparência. Podemos ficar tão ocupadas, tão cansadas ou tão desanimadas que abrimos mão de zelar pela imagem que apresentamos àqueles que nos cercam. Uma camiseta amassada, uma calça jeans velha, um tênis surrado…? O cabelo mal-penteado puxado para trás e amarrado com o elástico que salvamos do embrulho da feira? É assim que os nossos maridos nos vêem diariamente—relaxadas e descuidadas? E ainda queremos que eles nos considerem as mulheres mais especiais do mundo?! (É assim que o povo da igreja nos vê nas reuniões? E ainda queremos ser respeitadas?!)

Precisamos ser bonitas, asseadas, cheirosas e atraentes para os nossos esposos, dentro e fora de casa. Eles estão rodeados por estímulos visuais. Não tem como eles não notarem também o valor que o mundo dá à aparência. Eles estão cercados de mulheres que só pensam em serem e se sentirem atraentes e atraídas—não importa as conseqüências. Não tem como nós não estarmos cientes deste efeito também. Temos que avaliar bem como reagir. Isto não exige gastar muito dinheiro. Significa banho tomado, um pouco de cor no rosto, o cabelo lavado e ajeitado, desfazer-se das camisetas da última eleição, colocar um brinquinho… Se as nossas sandálias forem do tipo havaianas, por que insistir em usar aquela preta gasta e feia quando existem tantas lindas, bem baratas—até nos supermercados? Ele tem que saber que tem alguém interessado em agradá-lo em casa—uma companheira que zela para ter todas aqueles virtudes que Paulo e Pedro exaltam, mas, também, alguém que cuida da aparência externa porque quer ele como amante e admirador para o resto da vida.

Vamos pedir a bênção de Deus para cada uma de nós, no sentido de sermos pessoas realmente atraentes, com uma beleza interna sempre crescente e atuante, e uma aparência externa sempre bem cuidada. Vamos avaliar e melhorar a nossa aparência para que possamos acompanhar nossos maridos nos seus ministérios (e servir a Deus individualmente também) como mulheres dignas e elegantes. Sempre com modéstia. Com moderação. E com bom senso. Glorificando a Deus em tudo que fizermos.
Betty

P.S. Após a palestra, tivemos uma parte prática com várias senhoras que chegaram preparadas para compartilhar onde encontrar bons preços para as roupas e os acessórios do tipo que estavam vestindo. Vestidos, blusas, bolsas, sapatos, brincos, produtos de maquiagem, roupas de gestante—todos modernos e bonitos—mas comprados fora dos Shoppings com considerável economia. No caso de São Paulo—na “25 de março”, no Brás, na Liberdade, na José Paulino… E uma das participantes (minha filha) ofereceu uma pequena sessão de maquiagem, distribuindo amostras do material usado como presente para cada uma, comprados, bem baratinho, na “25”.

4 Comentários a “Graça e Formosura”

  1. Mical disse:

    Puxa vida, comecei ler um artigo achei bom….li outro e achei bom tambem..e assim foi…agora percebo que ja se passou uma hora e eu aqui lendo os artigos, agradeci a Deus porque no meio do meu dia pude receber palavras que edificaram meu coração.
    Obrigada por seu esforço no preparo de cada artigo de seu blog, Deus te abençoe sempre!!!
    E nunca deixe esse ministério, porque atraves desses artigos muitas pessoas serão muito abençoadas como eu agora.
    Um abraço
    Mical

  2. Rute Kaizer disse:

    Que artigo lindo! Me abencoou muito!!! Sempre entendi que a Palavra do Senhor nos aconselha a “pensar nas coisas do alto”, mas nao no sentido de sermos alienados, fora da realidade… Esse artigo ampliou minha visao e me deu um grande incentivo. Muito obrigada e que Deus abencoe! – Rute (Toronto, Canada)

  3. Romeu José de Assis disse:

    Parabéns pela mensagem. Como homem, concordo plenamente com suas considerações. Na verdade, sem importar com o sexo, as pessoas devem reconhecer no outro a beleza interior, bem como o capricho externo. O cuidado com o corpo que é a embalagem da alma. A formosura externa de hoje será atacada pelo tempo daqui a pouco, no entanto isso não importa, a “casa” tem que ser cuidada, mantida da melhor maneira – por dentro e por fora. Gente bonita tem Jesus o tempo todo. Extravasa suas instruções, sua agradabilidade. Mulher bonita, homem bonito, cumprem o que Senhor determina, especialmente com o amor ao próximo. Joinville/SC, 09/01/2011.

  4. Rozangela disse:

    Querida Betty,
    Estou amando ler os seus artigos, és um instrumento de Deus, continue pq desta forma tens abençoado muitas vidas. Veja que te encontrei por causa do “pós-cirurgico da tireóide” pesquisando no Google, ontem 09/02/2011, e já inserir “Crônicas do Cotidiano” entre os meus favoritos.
    Como agora só estou podendo “Clicar ao invés de falar…risos”, este tens sido canal de Deus para minha vida.
    Quem sou?
    Tenho 51 anos, cristã evangelica crente na verdadeira concepção da PALAVRA, lavada e redimida pelo o sangue do cordeiro o nosso Senhor Jesus Cristo.
    Casada e feliz no meu relacionamento conjugal, pois a cada dia temos construido um casamento solido na presença do Senhor, respeitando as nossas individualidades, mas sem esquecermos que somos uma só carne.
    Mãe de dois filhos maravilhosos, não citarei os seus nomes em respeito a privacidade deles pq apesar de jovens são avessos a exposição e principalmente pela internet.
    Meu perfil, 1.52 cm, 53K, tipo ampulheta, vaidosa com moderação ou seja bem cuidada, pois somos o templo do Espirito Santo, e assim precisamos cuidar dos nossos corpos fisicos também, acredito que devemos refletir Cristo em todas areas da nossas vidas.
    Irmã Betty, vou parar por aqui, pois sei que és muito ocupada, já tens livros publicado, és uma excelente escritora.
    Beijinhos

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