A Minha Vida Ficou mais Florida (8)

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Do mesmo modo que “Mamãe” era sensível à beleza, ela também se impressionava com a falta dela. Segue a descrição de uma fazenda chamado Mamulengo e como seu pai transformou a casa feia, que não tinha beleza alguma, meio escura e sombria, que respirava a coisas velhas, e que ficava abafada, numa boa e agradável morada. Nesta narrativa, a natureza e proximidade das plantas existentes não alegravam. Em vez disto, contribuíam para o mal-estar dos habitantes…

Mamulengo

Meu Pai comprou uma antiga fazenda de café situada entre Pirauá e Serra Verde. O nome da fazenda era “Mamulengo”. (Mamulengo significa um teatro de bonecas).

Tudo lá respirava a coisas velhas, do tempo do Império, de quando ainda havia escravos. Disseram-nos que a Casa Grande fora construída por braços dos escravos e já existia há mais de um século. Não sei se isso e as lendas que corriam eram verdadeiras ou não. Só sei que a casa não era construída com tijolos, mas com barro, uma casa daquele porte toda feita de taipa… A espessura das paredes era, de mais ou menos, meio metro!

Para se chegar lá, descia-se uma ladeira e subia-se outra — aí estava construída a casa, num aterro de dois metros! Uma casa enorme, paredes brancas, com um janelão lá naquelas alturas… A entrada era de lado. Havia aí uma enorme porta com várias janelas dos lados e atrás, pintadas de vermelho. Não tinha beleza alguma. A sala era imensa! Ladrilhada de lajota (40 X 40). Havia uns batentes, na entrada (degraus). Um quarto grande era pegado à sala (aí Pai colocou a sua farmácia). Continuando a sala de visitas eram os quartos, pequenos, dois ou três e a sala, bem grande, de jantar. Tudo era meio escuro, sombrio. As árvores eram quase em cima da casa, tão perto estavam. O cafezal chegava a poucos metros. A casa ficava abafada.

Descendo de lado por cinco degraus, arredondadas, estava a cozinha, grande e escura e úmida, com um enorme fogão à lenha, feito de barro com um forno, que mais parecia um forno de casa de farinha. Havia ainda um quarto, depois da dispensa que servia como depósito, para guardar lenha, latas, jarros de barro, para guardar água, etc. etc. Mãe estava grávida e muito gorda. Subir e descer aqueles batentes deve ter sido um sacrifício.

Poucos dias depois meu Pai estava, junto com os trabalhadores, aplanando aquele terreno ao redor da casa. E logo, logo, começou, com alguns pedreiros, a construir a sala de jantar, quartos e cozinha, no terreno que aplainara, deixando lugar pra terreiro, pra secador de café e pra jardins (ele não gostava de flores, mas sabia quanto minha Mãe as apreciava). Aquela era uma região com muita água e quando chovia ficava tudo, ao redor, alagado. Valetas foram cavadas pra escoarem as águas empoçadas…

Em um ano meu Pai transformou aquela casa feia, numa boa e agradável morada… Fez uma ala com quatro novos quartos, sala e cozinha novos, um belo e largo corredor, tudo de tijolo, bem feito, bem acabado e tudo claro, com telhas de vidro, aqui e ali pra não deixar passar a idéia de uma casa sombria, doentia, triste. Foi muito trabalho, muito esforço e muita economia…

Os moradores foram se dando a conhecer — Sr. Luiz e Sinhá Caetana, com os filhos Luiz e Ambrosino, e mais um casal de crianças. Sinhá Caetana ficou como lavadeira. Esta era uma família interessante, das poucas que ali moravam.

Depois de dois anos morando em “Mamulengo”, as coisas já estavam assentadas, os conhecimentos relacionados. Muitos outros trabalhadores (moradores) vieram morar na fazenda; meu Pai ajeitara casas, construíra outras de telha e tijolos e já plantara a safra de feijão, milho, inhame, macaxeira, roça, etc, etc. Já tínhamos vacas de leite, galinhas, porcos, perus, patos, guinés, etc, etc. Minha Mãe era muito ativa e comprava cabras, ovelhas e porcas e “dava de meia” às moradoras, pra no fim de um ano, venderem e repartirem os lucros.

Os cafeeiros eram cobertos pelas sombras dos cajueiros e mangueiras. Os meninos colhiam as castanhas de cajus que eram vendidas (por mais barato que vendessem — vinha sempre um comprador de longe, com cavalos, com caçuás (cestos de cipó), para comprar. Dava pra minha Mãe comprar as roupas dos meus irmãos para as festividades do Natal).

Pai cuidou daquela fazenda com muito empenho. E ele sabia tratar do solo, do gado, etc. e ia ensinando aos homens a cuidarem da lavoura. Graças a Deus tudo prosperava e todos os dias, no culto doméstico, Pai e Mãe agradeciam pelas bênçãos, pela alimentação sadia que Ele nos dava. Eram bênçãos para nós e para os trabalhadores rurais. (Pai não admitia na fazenda nem prostitutas, nem viciados em bebidas alcoólicas….). Exigia serviço bem feito, mas era para eles como um bom pai — ensinava, tratava de suas enfermidades, ajudava-os nas suas lavouras, nas colheitas e dava-lhes conselhos para a vida, tirados da Bíblia — pregava-lhes o evangelho. Alguns se converteram, outros não….

Valderez

Um Comentário a “A Minha Vida Ficou mais Florida (8)”

  1. Isia de Oliveira Gueiros disse:

    Valderêz
    Dei um belo passeio pela Fazenda Fandango.Recordei um pouco da Fazenda Poço das Ovelhas aonde passei algumas férias com papai e mamãe.Seu pai foi realmente um homem de Deus.Eu também lembro com orgulho do meu pai como um servo de Deus.Ambos estão no céu gozando da presença do Pai.Beijos Isia

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