Clicando o Presente, Perpetuando o Passado

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Dou graças ao meu Deus todas as vezes que me lembro de ti...
Filipenses 1.3

Já que estava com a “mão na massa” com a postagem anterior, resolvi escrever mais uma carta de reconhecimento—desta vez para a irmã do meu pai, uma senhora cristã, dinâmica e forte, que mora no Canadá. Esta tia tinha a mesma idade que minha mãe mas casou-se depois de mim.

Quando eu era menina, Tia H trabalhava com os irmãos na fazenda da minha avó (meu avô morreu quando eu tinha uns três anos). Além de tirar leite do gado, cuidava de uma enorme horta, dirigia o trator, trabalhava no campo… Também ajudava sua mãe com a casa. Era uma pessoa sempre alegre e disposta. Eu pensava que este seria o destino dela para sempre.

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Por ter saído da Holanda antes de completar seus estudos, ela não tinha diploma do ensino médio. Eu não acompanhei os detalhes desta fase, mas eu depois soube que estudou à noite para tirar o diploma e, um dia, ela apareceu em nossa casa para se despedir. Ficamos todos tristes, sem entender…

Mas ela foi para os EEUU para cursar uma faculdade ligada à nossa denominação. Já mais velha do que o resto da turma, adaptou-se à vida urbana, trabalhou enquanto estudou e conseguiu tirar o diploma universitário com honras. Recebeu bolsas de estudo, fez mais alguns anos de mestrado e doutorado e depois se empregou como bibliotecária numa grande universidade na capital do Canadá. E casou-se. Uns dois anos depois de mim. Não pude ir por já estar morando no Brasil. Foi com um senhor crente e afável, da idade dela, sem instrução universitária—mas muito habilidoso em trabalhos com madeira. E viveram felizes. Sem filhos, mas tendo companhia em todos os momentos, até hoje.

Pensei nesta tia com carinho no mês passado. E agora escrevi uma carta para ela, cuja primeira parte transcrevo/traduzo abaixo.

Se você se lembrar de alguma característica boa, ou de uma ação bondosa de alguém no seu passado, que ainda está vivo, encorajo-lhe agora a fazer algo parecido, por escrito ou por telefone, ou em pessoa—reconhecendo como aquela pessoa foi um canal de bênção para você. Especialmente se for alguém de idade, já se sentindo inútil ou supérfluo, estas palavras podem ser muito encorajadoras. E, se quiser compartilhar o feito e/ou o resultado, comente nesta postagem…

A ocasião desta específica lembrança da minha tia foi quando meu irmão caçula fez 50 anos no mês passado e fui olhar os meus antigos álbuns de fotografias para relembrar os velhos tempos. Ele também mora no Canadá…

03 de dezembro de 2007

Querida Tia H:
Algumas semanas atrás, o nosso G fez 50 anos e C escreveu para mim e para os outros irmãos pedindo ajuda com a celebração que estava organizando com alguns amigos. Eu, então, anotei algumas das coisas que me lembrava sobre G quando era pequeno e fui até meus álbuns fotográficos para obter mais inspiração. Eu havia feito cópias de várias fotos antigas dos álbuns da nossa mãe (cujas originais foram distribuído entre nós quando Pai faleceu).

Enquanto olhava e escolhia e recordava, me ocorreu que a razão que temos estas fotos é porque, era uma vez, havia uma certa jovem nos anos 50 que não apenas foi suficiente empreendedora para comprar e aprender a operar uma máquina fotográfica, mas que também se empenhava em colocá-la na sua bolsa e em tirar fotos (posadas e espontâneas) da sua família. Uma vez reveladas, ela fazia cópias para as pessoas clicadas (ou dava as próprias). Desta maneira, ela acabou fornecendo uma história tangível para suas sobrinhas e seus sobrinhos.

Tia, nós não teríamos nada (ou muito pouco) disto, se não fosse pela senhora! Demorou muitos anos para nossos pais investirem numa câmara. Foi a senhora que possibilitou que nós agora nos sentemos para olhar aqueles pequenos retângulos pretos e brancos que chamamos de fotografias. Com um clique e um giro na sua “caixa mágica”, a senhora captou aqueles momentos, aqueles lugares e aquelas pessoas que fazem parte do nosso passado e que povoam as nossas memórias. Podemos olhá-los e perceber semelhanças com os filhos uns dos outros e talvez até dos nossos netos algum dia. Podemos relembrar coisas que nos entristeceram ou assustaram.

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Momentos especiais retornam às nossas lembranças e vemos os nossos pais em maneiras que não lembramos. Isto faz com que possamos nos identificar com eles e apreciar mais as suas lutas e desafios. Posso agradecer a Deus pela segurança cedida por pais dedicados, a beleza e a abundância da fazenda, pelos bichinhos de estimação que me alegraram e que pude amar… Pelas peônias que nasciam tão fielmente no nosso jardim nas primaveras e pelos arbustos de lilás com os quais aprendemos a fazer fragrantes buquês misturando as cores – branco, rosa e várias tonalidades de roxo e lilás, a cada início de verão.

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“Escaneamos” e anexamos algumas das fotos que a senhora provavelmente tirou. E tem uma que outra pessoa tirou, é claro, mas provavelmente com a sua máquina; da senhora comigo e um cachorro.

De qualquer jeito, quero que a senhora saiba que eu realmente aprecio ter estas fotos para olhar e relembrar. Dou graças a Deus não apenas por elas, mas por muitas outras coisas que fez por nós, pelas brincadeiras que estimulavam a nossa imaginação, pela boneca “Brenda”, pelas histórias que contava, por nos hospedar na sua casa, nos levando para conhecer novos lugares e adicionando momentos de aventura e prazer às nossas vidas. Muito obrigada. …

…. Um grande abraço p’ra senhora e p’ro Tio J
Carinhosamente, Betty

3 Comentários a “Clicando o Presente, Perpetuando o Passado”

  1. Carlos Henrique F. Borges disse:

    Valeu Betty,

    Acabei de escrever uma cartinha a minha vozinha de 93 anos!

    Deus te abençoe,

    Carlos Henrique.

  2. Mirciloni disse:

    Quando eu era criança (hoje tenho 43 anos), em minha casa pobre, em um dos meus aniversários, ninguém havia me dado parabéns, o dia foi triste e não teve nada de especial. Eu estava muito triste. De repente, à noite, a vizinha do lado – D. Valdiza – me chamou e disse: olha o que eu fiz para ti. Era um lindo bolo de abacaxi. Pronto, tudo ficou maravilhoso e eu nunca esqueci disso. Já adulta, toda vez que encontro com ela, sempre menciono a importância daquele bolo para mim… e sempre choramos… como faço agora…

  3. Regina Helena disse:

    Gostei muito do seu site. As palavras fluem de um modo encantador. E, o essencial, é que você usa este dom pra falar do amor de Deus. Parabéns! Deus abençoe imensamente a sua vida. Pra mim, foi um prazer saber da sua existência e me deliciar com suas histórias.

    Terei imenso prazer em receber sua visita em meu blog (www.destilardosfavos.blogspot.com) também e, quem sabe, nos conhecermos melhor.
    Grande abraço na paz e no amor do Pai,
    Regina Helena

    SOLI DEO GLORIA!

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